sexta-feira, 1 de julho de 2016

Emprego, essa definição de identidade #1





Comecei a trabalhar cedo. Com os meus fresquíssimos 16 anos fui para um curso profissional que muito rapidamente transformei numa sólida experiência, cheia de canudos e formações. Se tenho um amor profundo pela comunicação onde me sinto totalmente Eu, a área da saúde está-me nas veias. E foi o meu rumo durante 18 anos como profissional. Gabinetes privados, permanência urgentista, Hospital estadual e por fim clínica privada. Trabalhei, como diz o meu marido por esta vida e as próximas. Horários estranhos, trabalhar quando ainda todos dormem, semanas seguidas sem folgas, sem férias, sem feriados, fora todos os Doutores e Doutorzinhos com o ego do tamanho dos Alpes com quem foi preciso lidar diariamente. Sempre que entrei num novo desafio dei-me de corpo e alma, e nunca me arrependi. O último emprego que tive em Genebra foi o culminar do que eu sempre quis, Assistente de Direcção talvez na clínica privada mais conceituada da Suíça. Proposta com que fui brindada poucos meses antes de engravidar da nossa flor de mel. Fui muito feliz durante aqueles meses mas a decisão de largar tudo, regressar a Portugal deixou-me ainda mais feliz. 

Se foi uma decisão tomada de animo leve? Não claro, não foi, até porque havia toda uma organização em volta da filhota M, escola, adaptação a uma nova cultura, a língua etc. Mas percebi finalmente que não valia a pena lutar contra o que tinha mesmo de ser. E o que tinha mesmo de ser foi. Regressei a casa com 24 anos de malas, lutas, lágrimas, experiências, uma filha de 14 anos e uma barriga de 8 meses de Alice. Se mudou a minha vida? Oh se mudou! Uma daquelas viragens a 180°!  

Hoje me dia encontro-me na posição de dizer que sou "Mãe a tempo inteiro" e vejo os suaves sorrisos em alguns rostos. Sorrisos que me fazem automaticamente passar por dondoca aos olhos de uma certa sociedade. Como tenho a Alice na creche, o pessoal pensa que passo os meus dias em cabeleireiros, que tenho sempre as unhas arranjadíssimas ou ando enfiada no Shopping o dia inteiro a gastar o dinheiro do meu milionário esposo. Seria o máximo se fosse verdade, só que não. Tenho muita pena mesmo, acreditem. Ia amar. Mas os meus dias são bem menos glamorosos que me inventam.  Passo a ferro (a muuuuuuito custo, odeio), lavo, cozinho (adorooo), arrumo brinquedos, dou raspanetes, dou carinho, faço bricolages, ajudo o marido, enfim... Estou muito mais disponível que uma mulher que sai de casa todos os dias às 8:00 e só regressa às 19:00. Mas ao que parece dizer que trabalho numa empresa ou whatever, dá-me automaticamente uma identidade do que dizer que sou Mãe. Tens emprego? És alguém. És padeira? és alguém! És vendedora? És alguém! Tens uma posição na sociedade. Existes. Ser Mãe a tempo inteiro na grande maioria das vezes significa para muitos "não fazer nada". Ser Mãe não é uma profissão nem muito menos uma ocupação. É o que é. É um emprego que vem do coração. Uma entrega de si mesmo a 2000%. Ao início também foi muito difícil psicologicamente para mim, lidar com bocas como " Ai tão bom, tens uma sorte em estares sem fazer nada", um "poooois estás em casa!" como se fosse o paraíso e tivesse uma catrefada de empregadas e ou que tudo se fizesse por magia.

É delicioso estar em casa, é! 
Dou-me ao luxo de levar a Alice à creche às 10:00 todos os dias, mais tarde às vezes até. Dou-me ao luxo de almoçar todos os dias com a minha Marina e o meu marido, e não só nas refeições da noite. Tenho o luxo de me sentar no meu sofá e escarrapachar-me meia hora ou mais se me apetecer. De ter tempo para os meus projectos pessoais, e são tantos! Tenho uma vida doce. Tenho. Se é fácil todos os dias? Não, não é. Ás vezes sinto saudades de ter aquele pico de stress, mas basta a Alice chegar a casa para senti-lo novamente.

Não, é verdade, a vida não me custa a passar.
Hoje não me custam as rotinas que se repetem, com o sol, com a tranquilidade do meu lar, com o tempo de qualidade para as minhas meninas, tempo de qualidade para organizar as coisas na minha casa, tempo para mimar um pouco mais o meu marido. Cansei-me de explicar o que me motivou em deixar o certo pelo incerto. Trocar uma condição financeira muito mais favorável, à minha vontade de não me separar nem mais um dia que fosse do meu marido. É assim... Há quem não consiga entender os que não se movem só por dinheiro e que há coisas que dinheiro nenhum do mundo paga. 

A Heidiland é sem dúvida um dos sítios mais bonitos que eu já vi, mora eternamente no meu coração, aloja uma boa parte do que sou e dos meus afectos. As saudades hoje vivem-se ao contrário. Mas a minha alegria é proporcional à imensa gratidão que sinto por tudo o que a vida me tem dado. E é tanto.

Sou Mãe a tempo inteiro. E tenho orgulho nisso. 

Deal with it, my friends. 


parte 1..........

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